Por Joêzer Mendonça
Nos últimos anos, o gospel deixou de ser um estilo musical de origem norteamericana e agora é um catalisador das novas atitudes e posturas evangélicas. O cantor gospel tem se tornado não apenas o intérprete musical da mensagem evangélica, mas também passou a ser considerado um multiplicador financeiro de adereços, acessórios, roupas, eventos. O repertório gospel interage intensamente com os estilos de maior sucesso do repertório pop.
Para entender o gospel, não basta passar o dia ouvindo gospel ou lendo as entrevistas dos artistas do gospel. Não importa se tempo é dinheiro. Gastei ambos em bibliotecas e livrarias. Além disso, todo pesquisador iniciante acha que está inventando a roda. Foi assim que descobri outros e melhores estudiosos descrevendo o cenário gospel com a ajuda da sociologia da cultura e do estudo das mídias.
Vivemos numa sociedade extremamente afeita ao uso das mídias coletivas (de massa). Mas é uma sociedade em que as pessoas valorizam sua identidade individual. Enquanto as igrejas atravessam uma crise de hierarquia, o fiel tem nas mãos um cardápio self-service de dogmas e interpretações (e músicas) que satisfaz sua autonomia e suas novas demandas de consumo evangélico.

As atividades de mercado e o crescimento midiático das igrejas chamadas neopentecostais são o veículo de promoção tanto do evangelho quanto da carreira de artistas. Comércio e consumo não são pecados, ora, pois. Então qual é o problema? No meu trabalho, aponto algumas sugestões de reflexões:
- Quando um artista cristão, autodenominado levita, faz publicidade de marcas de roupas e adereços, isso não seria uma problemática utilização da aura de sagrado do artista para comercializar objetos de consumo?
- Os megaeventos em logradouros públicos, com grande aparato tecnológico e presença de ‘levitas", têm cunho evangelístico ou se prestam mais para dar visibilidade ao carisma de líderes e artistas evangélicos?
- Alguns cantores de funk gospel trocaram de letra, mas não deixaram o "batidão". Isso significa uma sacralização do estilo musical ou uma secularização do tema religioso?
- Os ministérios de louvor estão atraindo pessoas e levando milhares a cantar. A repetição ad infinitum de poucos versos, as letras "apaixonadas por Jesus" e o gigantismo dos shows são um padrão que reflete exatamente a teologia neopentecostal?
- O hip hop conseguiu permanecer como uma música de protesto dentro da indústria fonográfica gospel?
- A balada gospel é, como seus organizadores dizem, uma oferta de diversão e salvação?
Quando alguém escreve textos indicando falhas e pontos críticos na indústria gospel, muitos se apressam em dizer que o autor é um pecador impenitente e invejoso que só sabe julgar os outros. Por isso, como criticar as ações de um mercado se só as intenções do coração é que contam? Complicado. Mas pesquisei assim mesmo, até porque meu trabalho não é de avaliar a sinceridade da fé, mas as atividades e comportamentos que movimentam o gospel no Brasil.
Minha dissertação está disponível no site do Instituto de Artes da UNESP. O título ("O gospel é pop: música e religião na cultura pós-moderna") promete, mas não tenho respostas prontas e definitivas. De minha parte, espero ao menos ter feito as perguntas certas.
Joêzer Mendonça fez sua pesquisa de mestrado na Unesp.
FONTE: Cristianismo Criativo